Cotas não são esmola, entenda

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 Cota raciais

A lei de cotas existe há cerca de 8 anos no Brasil, mas ainda há muito debate acerca da sua importância e legitimidade. Grande parte da sociedade é ativamente contra, alegando que a reserva de vagas em universidades federais para pretos, pardos, indígenas e pessoas de classes sociais baixas trata-se de uma esmola, sob o pretexto de que estes não são capazes de ingressar por mérito próprio.

A questão ainda é polêmica, no entanto, há dados que mostram que a lei pode, sim, beneficiar diversos grupos, colocando-os em lugares que antes não ocupavam. Entenda mais sobre o que é o sistema de cotas raciais, sociais e econômicas, como ele funciona e porque foi implementado.

Para começar, entenda o contexto social 

O final da escravidão, assegurada pela Lei Áurea em 1888, não garantiu a igualdade racial entre brancos e negros no Brasil, muito pelo contrário: os negros, desde então, têm sido submetidos à marginalização e a pobreza por causa do racismo estrutural, e também por causa dessa herança histórica.

As desigualdades já começam nos primeiros anos escolares, de acordo com a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) Contínua Educação 2019, fazendo com que a taxa de pretos e pardos analfabetos seja três vez maior do que o percentual entre brancos. Já dos 10 milhões de jovens brasileiros entre 14 e 29 anos que deixaram a escola sem ter completado a educação básica, 71% são pretos ou pardos.

O estudo “Ação Afirmativa e População Negra na Educação Superior: Acesso e Perfil Discente”, aponta para resultados que refletem o mesmo cenário. Em 2017, os negros ainda correspondiam a 32% das pessoas com ensino superior completo. E considerando a população com 25 anos ou mais, apenas 9,3% dos negros tinham ensino superior completo, enquanto na população branca era de 22,9%. 

Porque as cotas raciais existem?

Há décadas, ativistas de diversos movimentos sociais e políticos, que promulgavam a equidade racial no Brasil, já apontavam a dificuldade de negros terem educação de qualidade, em especial, alcançar o ensino superior. 

O primeiro grande avanço se deu em 2003, quando o estado do Rio de Janeiro foi o primeiro a oficializar a reserva de vagas para alunos pretos, pardos, indígenas ou vindos de escolas públicas. Tanto que a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) foi a primeira instituição de ensino brasileira a adotar o sistema de cotas.

Partindo do contexto histórico de que os negros estão em maior situação de pobreza e falta de acesso à educação, a Lei nº 12.711/2012, enquanto ação afirmativa, surgiu para favorecer e garantir o acesso facilitado à educação para grupos historicamente desfavorecidos, como os pretos, pardos e indígenas, mas, também, incluindo alunos que estudaram integralmente em escolas públicas.

As cotas raciais e sociais são um tipo de discriminação?

As ações afirmativas são medidas que discriminam para integrar, ou seja, ao contrário das medidas segregatórias – como o regime Apartheid na África do Sul -, elas servem para favorecer grupos historicamente impedidos de acessar direitos básicos garantidos pela Constituição, como moradia, educação e segurança. 

Em outras palavras, as cotas sociais e raciais existem para que pessoas pobres, pretas e indígenas tenham acesso à educação de forma igualitária e que, dessa forma, possam competir no mercado de trabalho e ocupar posições na sociedade que antes lhe foram negadas.

Como funcionam as cotas raciais, sociais e econômicas?

A Lei de número 12.711, que passou a valer a partir de agosto de 2012, conhecida como lei das cotas, define que todas as Instituições de Ensino Superior que respondem ao Ministério da Educação, juntamente com as instituições federais de ensino técnico de nível médio, devem reservar 50% de suas vagas para as cotas.

As vagas reservadas (por curso e turno) são distribuídas da seguinte forma: candidatos que estudaram integralmente em escola pública (a exigência vale para o ensino médio no caso de instituições de ensino superior e fundamental para as escolas técnicas de nível médio); candidatos com a renda familiar per capita igual ou inferior a 1 salário mínimo e meio; candidatos que se autodeclaram pretos, pardos e indígenas.

Apesar do sistema de cotas raciais, sociais e econômicas, o estudante que se enquadra nessas classificações ainda precisa possuir os conhecimentos mínimos necessários para ser aprovado pelo processo seletivo da instituição. O que muda é apenas as condições de competição.

Primeiros reflexos da lei de cotas

A lei das cotas é apenas uma das poucas ações afirmativas necessárias para corrigir a desigualdade social e racial no Brasil, mas não deixa de ser um bom começo. 

Segundo dados do estudo “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, em 2018, os pretos e pardos passaram a ser 50,3% dos estudantes de ensino superior da rede pública. Embora seja um grande salto, por formarem a maioria da população (55,8%), seguem sub-representados.

Já na faixa-etária de 18 a 24 anos que estudava, o percentual cursando ensino superior aumentou de 50,5% (2016)  para 55,6% (2018), mas ainda ficou abaixo do percentual de brancos da mesma faixa etária (78,8%).

O que esperar daqui pra frente?

A lei que garante as cotas está em vigor há menos de uma década e já se pode afirmar que a mudança social causada por ela foi grande. Em 2022, 10 anos após a implementação, está prevista uma revisão de eficiência das políticas aplicadas.

 O que será impossível de negar é a presença cada vez maior de pretos e pobres ingressando nas universidades, conquistando seus diplomas e quebrando os estereótipos e estatísticas, ocupando o espaço acadêmico que durante séculos significou a exclusão e o elitismo.



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