Mulheres contam como é viver com mastectomia

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  • Talitha Benjamin
 Mulheres contam como é viver com mastectomia

A notícia do diagnóstico do câncer de mama é sempre um grande choque para a mulher. Isso porque, além das preocupações características de outros tumores, esta doença mexe profundamente com diversos aspectos da vida da paciente, principalmente se ela precisar passar pela mastectomia.

A mastectomia é uma das principais formas de combater o câncer de mama. Trata-se da total remoção do tecido mamário, podendo ser simples, dupla (quando há risco de desenvolvimento da doença em ambos os seios), ou poupadora (caso haja o desejo e a possibilidade de reconstrução da mama).

Segundo um apontamento feito pela Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), a cirurgia ocorre em 70% dos casos de câncer de mama diagnosticados no país. Entre 2008 e 2013, uma cirurgia deste tipo foi realizada a cada 40 minutos pelo Sistema Único de Saúde. A pesquisa da SBM também revela que esse número alto se dá pelo diagnóstico tardio e dificuldade de acesso a consultas, exames, biópsia e tratamento.

Do diagnóstico a cirurgia

Sanae Yoshida descobriu um nódulo durante o banho, aos 42 anos, quando ainda morava no Japão. Os exames que realizou na época não mostraram nada de significativo, apenas a necessidade de acompanhar a cada 6 meses. Somente dois anos depois, já no Brasil, foi que descobriu que o nódulo tinha aumentado.

“A cirurgia ficou marcada para 4 meses depois. Sou uma pessoa calma, somente uma vez tive uma crise de choro, mas por pouco tempo”, conta Sanae, que encarou todo o seu tratamento – que incluiu a mastectomia, quimioterapia, radioterapia e suplementação hormonal – com bastante tranquilidade e bom humor.

Na época, ainda não era possível preservar a pele e o mamilo na remoção radical do tecido mamário. No entanto, ela aguentou firme: “encarei como um ato normal, que precisava ser feito para que eu pudesse ser curada, pois tinha uma filha de 11 anos para criar e o marido que teve AVC na mesma época em que estava fazendo exames”, relembra.

Ana Paula Freitas Fagundes Santos, de 45 anos, descobriu o câncer quando ele já estava em metástase (quando a doença chega em outras partes do corpo) e precisou fazer a mastectomia parcial: “foi muito difícil ouvir da médica que iríamos torcer para ser apenas um câncer de mama”, conta ela, que na época, havia acabado de mudar-se de Uberlândia (MG), para Porto Feliz, no interior de São Paulo.

O diagnóstico causou muita preocupação, e veio em um momento familiar bastante inoportuno: “eu havia perdido minha mãe há apenas 6 meses, tinha gastado todas minhas economias para me mudar e o meu único conhecido era o meu pai. Minha irmã tinha acabado de descobrir a gravidez. Foi muito desafiador.”

Após meses de uma difícil jornada pela quimioterapia que a deixou bastante fragilizada física e psicologicamente, veio a cirurgia: “Eu me assustava muito. O tumor estava muito próximo a um nervo, e eu corria o risco de perder o movimento do braço e ter um linfedema”, conta ela. O linfedema é o inchaço causado pelo acúmulo do líquido linfático no tecido adiposo: “a perda da mama não me incomodava, e sim o risco de perder o braço. Com um filho pequeno, com necessidades especiais, isso me preocupava muito” conta Ana Paula.

A mastectomia realizada em Ana foi parcial, o que significa que foi preciso retirar apenas parte do tecido mamário. No caso de Sanae, após a remoção total, foram necessários mais 5 anos de tratamento. Houve também a reconstrução com expansor, que é uma prótese vazia sob o tecido cutâneo que expande a pele gradualmente, para que depois seja aplicada uma prótese.

Atualmente, todos os métodos de reconstrução mamária são garantidos por lei para as mulheres que precisaram remover uma ou as duas mamas, tanto pelo SUS quanto por convênios e hospitais particulares.

Apesar de ser invasivo, doloroso e difícil de encarar, a mastectomia é atualmente o único procedimento capaz de curar um câncer, já que a remoção do tecido mamário impede a metástase.

Apoio durante o tratamento e recuperação

Para ambas as mulheres, o apoio da família e dos amigos foram essenciais para que o tratamento fosse encarado com mais facilidade. Ana, que na época tinha apenas o pai, a irmã, o marido e os filhos, afirma: “nesse momento, o apoio é indispensável. Eu não tinha amigos, pois tinha acabado de chegar em uma cidade nova. Durante a quimioterapia, fiz duas amigas que durante os momentos mais difíceis, quando eu estava quase desistindo, me ajudavam, me tiraram de casa, já até me carregaram. Hoje são parte da minha família.”

Sanae teve todo o apoio dos entes queridos, mas aponta para alguns olhares de julgamento: “alguns amigos me olhavam como se eu estivesse a beira da morte, mas graças a Deus, não me incomodava tanto. Talvez por isso meu tratamento não tenha sido sofrido, estava sempre com um sorriso no rosto”, relembra, hoje com 55 anos.

A ajuda de outras instituições dedicadas ao tratamento e auxílio para pessoas que passam pelo câncer de mama também foi essencial. Todo o tratamento de Sanae foi realizado no Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher, ala hospitalar que pertence ao hospital a UNICAMP. Ela aconselha: “todos que passam por esse problema devem procurar ajuda, especialmente de quem já passou pelo câncer. Quem nunca passou pode ajudar, mas não é a mesma coisa. Só quem já sentiu sabe como é.”

Atualmente, Sanae é voluntária na ONG VOLACC (Voluntárias de Apoio no Combate ao Câncer), em Indaiatuba (SP).

Já Ana Paula teve apoio de Associação Acreditar Grupo de Apoio Às Pessoas com Câncer, em Porto Feliz: “eu e meu marido estávamos desempregados, e eles me doaram todos os suplementos que precisei”, conta ela.

Vida pós-mastectomia

As lições aprendidas durante os longos tratamentos são muitas, mas Sanae destaca a que mais a marcou: “antes me preocupava muito com os outros, olhava menos pra mim, muitas vezes me prejudicava somente para ver a outra pessoa satisfeita. Hoje vejo diferente, temos sim que ajudar o próximo, mas primeiro eu.”

O amor próprio e o bem-estar fazem toda a diferença durante todo o processo. Ana recebeu muitos aconselhamentos do seu médico: “ele sempre me dizia que a minha cura dependia 30% da quimioterapia e 70% de mim, da forma como eu lidava com a situação”, conta ela, que evitava pesquisar sobre a doença por conta própria para evitar a angústia, e diz qual foi a sua maior lição:

“A gente não tem amanhã, apenas o hoje. Recentemente recebi um convite para um churrasco e fui, mesmo com a unha sem fazer e o cabelo sujo. Eu nunca faria isso antigamente. Não deixo mais de fazer nada que eu quero fazer. Sei valorizar as pessoas certas, pois agora sei quem realmente está comigo.”

Sanae compartilha da mesma opinião, e sobre o seu conselho para quem está encarando o mesmo problema, ela diz:

“Para que o resultado do tratamento seja positivo, o seu espírito precisa estar sempre bem, não importa qual o tratamento, seu psicológico é o seu futuro.”



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