Preta patrícia e afropatys: o estilo das mulheres negras que rompem tabus
- 13 de março de 2022
- 11:30
As discussões sobre relações raciais trouxeram novas formas de enxergar a existência de pessoas negras no Brasil, principalmente se falamos sobre estética e identidade. Além da importantíssima e constante influência da população preta na moda, na cultura e na beleza, a cada dia surgem mais e mais tendências, existências e formas de se entender e enxergar a vivência do grupo que hoje forma metade do país. Recentemente, pudemos ver estes exemplos no surgimento do termo “afropaty”, que ganhou as redes sociais e até mesmo músicas sobre um lifestyle único de mulheres negras brasileiras.
Para quem acompanha o mundo da moda e da beleza, já deve ter esbarrado em “afropatys”, ou “pretas patrícias”. Trata-se de um estilo que sempre existiu, mas apenas recentemente ganhou força nas redes sociais no Brasil. As patricinhas, só que negras, vão muito mais além da futilidade e da preocupação excessiva com a aparência, roupas e acessórios caros: é sobre a ascensão social e a conquista de direitos de mulheres negras, que desde sempre estiveram excluídas da conversa.
Como surgiram os termos “Afropaty” e “Preta Patricia”?
Ambas as gírias são referências diretas ao termo “patricinha”, que por sua vez, é o diminutivo do nome Patrícia, que em sua origem em latim, era utilizada pelos romanos para se referir à membros da alta sociedade. Afropaty e Preta Patrícia são as mulheres negras com alto poder aquisitivo, com um estilo de vida focado na aparência e, quando possível, na ostentação de um lifestyle de luxo, com roupas de grife, viagens e joias.
Você pode pensar: “o que difere uma afropaty de uma patricinha normal?” e a resposta é simples: as patricinhas brasileiras, em geral, são meninas brancas, de famílias ricas, com uma vida luxuosa, muitos amigos e pretendentes, o que é totalmente o oposto da realidade de mulheres negras no Brasil. A existência marcada pela desigualdade, a solidão e a falta de oportunidades é a norma para essa parcela da população: os homens brancos que fazem parte do 1% mais rico do país detém 15,3% de toda a renda, uma fatia maior do que todas as mulheres negras adultas juntas – os dados são de um levantamento exclusivo do Made/USP (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades, da Universidade de São Paulo).
Assim, podemos ver uma que preta patrícia, ou uma afropaty, não são apenas meninas ricas que gostam de luxo: há também o contexto social e econômico de um grupo que vive e ostenta a ascensão social e a conquista de direitos da população negra graças ao combate ao racismo. São mulheres que, através de um esforço dobrado quando comparado às pessoas brancas, estudaram muito, na maioria das vezes, graças à política de cotas raciais, e hoje possuem um poder aquisitivo muito maior do que a maioria. Muitas vezes, são as primeiras da família a conquistar um diploma universitário e a independência financeira.
A representatividade aqui também importa: artistas como Beyoncé e Rihanna, e no Brasil, Lais Oliveira e Erika Januza, que possuem seus próprios impérios e hoje são ícones de uma inegável excelência negra, também dão fôlego e inspiram moças pretas e brasileiras a buscarem fugir das estatísticas, e para trabalharem na construção de um país onde as exceções, ou seja, as mulheres negras que prosperam, sejam crescentes.
Racismo e a reação social ao movimento de jovens negras que prosperaram financeiramente
“Me ver pobre, preso ou morto já é cultural”: a letra da música Diário de Um Detento, do Racionais MC’s é uma crítica atemporal à segregação econômica, política e social presentes no Brasil. Quando se fala de patricinha, o imaginário popular conjura uma menina branca, loira, de olho claro e roupas de grife. Já quando pensamos no termo “favelada”, a imagem é de uma mulher preta. O racismo no Brasil dá conta de separar quem tem classe, elegância e poder aquisitivo das pessoas negras.
Quando falamos do consumo de artigos de luxo, como roupas, carros, acessórios de grife e joias caras, falamos também de uma indústria que está fora do alcance para a maioria dos negros, principalmente de mulheres. Não é à toa que dificilmente as observamos nas campanhas de publicidade de tais marcas. Isto tem mudado recentemente: o debate sobre antirracismo trouxe à luz também a ausência e a invisibilidade das mulheres negras em diversos espaços, entre eles, o da moda, da beleza e do luxo. A presença da cantora Beyoncé na propaganda de uma tradicional e luxuosa marca de joias foi emblemática para simbolizar uma mudança de abordagem, não só das marcas, ao passar a enxergar e incluir esta camada tão significativa da população, mas também das próprias mulheres negras, de fazerem questão de ocuparem outros espaços.
Portanto, ser afropaty ou preta patrícia é desafiar um viés racista da sociedade: e não, não é preciso ser rica para ser uma afropaty. Buscar ascensão social e econômica através do estudo, do trabalho e do próprio esforço é o que está na mente das mulheres negras que se declaram desta forma. Cuidar da beleza e ser antenada na indústria da moda é apenas uma forma de empoderamento, ocupar espaços que por séculos foi negado a uma fatia gigantesca da população brasileira. Mulheres negras podem e conseguem alcançar o topo!